quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Entrevistas com Éric Rohmer

Interesso-me cada vez mais por entrevistas. É bom ver artistas (e gente interessante de todo tipo) respondendo espontaneamente a perguntas, questões e problemas, ouvir suas falas naturalmente, suas hesitações, gaguejares, enganos, empolgações e afins.

Se já é excelente poder ver uma entrevista bem conduzida, o prazer ainda dobra se o entrevistado é alguém que você admira, que tem muito a dizer (a você e a n'importe qui). É o caso de Éric Rohmer, cineasta historicamente alheio a aparições públicas.

Garimpando no YouTube, consegui localizar algumas especialíssimas ocasiões em que Rohmer sai da caverna e dá o ar de sua graça. E como vale a pena descobrir esses eventos! Rohmer, cineasta de gênio incrível, fala de cinema com um entusiasmo juvenil: é maravilhoso ouvi-lo relatando casos de sua carreira e de sua obra enquanto analisa seus filmes numa humilde exibição em videocassete, por exemplo; e sua alegria ao comentar os aparatos e aparelhos tecnológicos utilizados para tal ou tal efeito fílmico, do tipo de câmera usado para um determinado plano até o filtro que simula a luz específica para uma sequência cromaticamente importante!

O material que encontrei foi tão bom que não resisti a dividi-lo neste espaço, recomendando a todos que salvem bem esses vídeos antes que o YouTube mais uma vez arbitrariamente resolva se livrar de todos (por haverem infringido, como sempre, algum dos imaginários direitos sempre alegados). Além do especial (de quase duas horas) da excepcional série Cinéma de notre temps (atualização do Cinéastes de notre temps, dos anos 1960), em que Jean Douchet entrevista um recluso Rohmer em 1993 (quando estava em época de mudança de seu escritório da Films du Losange), podemos ver Rohmer em plena lucidez em 2006, poucos anos antes de morrer, entrevistado por Barbet Schroeder (seu ex-ator e produtor), além de um documentário sobre o belíssimo Conto de verão rohmeriano e mais um pequeno extrato de Rohmer dirigindo um de seus melhores filmes, A mulher do aviador. Todas as entrevistas possuem legenda em inglês.

 

Bônus: um episódio que Rohmer dirigiu da citada série Cinéastes de notre temps — bastante raro, inexistindo na internet alguns anos atrás.

sábado, 14 de setembro de 2013

Grandes ilustradores: John R. Neill

Após o estrondoso sucesso de The wonderful wizard of Oz, Frank Baum decide ceder ao apelo de seu público (e de seu bolso) e dar continuidade à série sobre as aventuras envolvendo a terra e os personagens de Oz. O segundo livro, The marvelous land of Oz, sai quatro anos após seu antecessor — fazendo dessa continuação a mais "demorada" da coleção: quase todos os livros saem apenas um ano após o anterior.

Pelos prefácios das obras, é fácil entender por que Baum criou essa certa resistência: assim como Conan Doyle e tantos outros autores de personagens muito marcantes, Baum resistia a ter seu nome associado a apenas uma criação. São divertidos (e enternecedores, de certo modo) seus sutis pedidos aos leitores: queria escrever outras obras, sair um pouco do universo de Oz. Não conseguiu, mas fez o possível para condensar várias ideias e personagens diferentes ao longo da saga, tentando (e conseguindo) definir um mundo "ilimitadamente limitado": as fronteiras de Oz são infinitas, as possibilidades de aventuras e acontecimentos e pessoas diferentes são infinitas, a imaginação é infinita.

No segundo livro, Dorothy não aparece. É a maneira de Baum começar sua brincadeira. Uma continuação sem a protagonista original! Em seu lugar, conhecemos outras personagens (e revemos outras tantas), sendo-nos apresentada ao fim do relato a princesa Ozma, governante de Oz, que irá aparecer doravante em todos os livros. Baum gosta de introduzir muitas personagens novas e fazer as antigas aparecerem em relatos, lembranças ou mesmo pessoalmente.

Após seu desentendimento com Denslow, artista responsável pelo ápice da iconicidade gráfica do mundo de Oz, Baum entra em acordo com John R. Neill, ilustrador prolífico de jornais e revistas, que entra em Oz para não mais sair: são dele os desenhos de todos os livros de Baum sobre Oz, exceto o primeiro (feito por Denslow), e mesmo após a morte de Baum ele continuou a ilustrar os livros seguintes — os dezenove de Ruth Plumly Thompson, admiradora de Baum, e três de sua própria autoria! Total entrega, interrompida apenas com sua morte, em 1943.

Neill sai da sombra de Denslow e remodela Oz. Sua Dorothy, por exemplo, é bem diferente: a de Denslow é uma menininha gorducha e baixinha, aparentando ter uns seis anos; Neill "espicha" Dorothy e a torna mais mocinha, feminina, vaidosa, crescida, por volta de uns dez anos (apesar de o texto de Baum fazer constantes referências a ela como uma little girl). Ozma é também uma jovem bonita e talvez próxima da idade dos leitores que acompanharam as aventuras de Oz desde o começo, na virada do século XIX para o XX (em alguns livros da coleção é proposta a discussão metafísica da idade de Ozma, que aparentemente não envelhece).


Com a profusão de personagens e ambientes criados por Baum, Neill pôde exercitar sua arte em muitos desafios bem sucedidos: crianças, fadas, monstros, castelos, animais, criaturas encantadas de todo tipo, cores irreais, não houve o que ele não fizesse. Experimentava com nanquim, aquarela, várias formas de pintura e concepção visual. Seu trabalho é de um esplendor incrível, e é uma pena que não tenha o reconhecimento do de Denslow, por estar associado a obras hoje menos difundidas de Baum — e enquanto The wonderful wizard of Oz ganha sempre inúmeras edições, as obras seguintes da série costumam vir amontoadas em edições simples, sem as ilustrações e portadas originais, o que é lastimável. Ao menos é possível localizar na rede a maior parte (se não todas) das magníficas ilustrações de Neill (não só as de Oz), das quais a pequena quantidade reunida aqui é pálida amostragem.