quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Gummi bears

A série animada mais lembrada e referenciada da Disney é provavelmente DuckTales — com justiça, pois trata-se de uma bela série, de boa animação e de episódios e personagens fortes e memoráveis, superior a quase todas as séries posteriores. Mas há uma série que veio ainda antes e que pelo menos "empata" em qualidade com a dos patos aventureiros (e, em alguns pontos, creio que a supera): Adventures of the Gummi bears (aqui chamada de Ursinhos Gummi).

Os Gummis são ursos coloridos e falantes que conviviam pacificamente com os humanos em uma época remota, até que houve um momento de rompimento e os ursos ficaram tão reclusos (e escassos) que adquiriram o status de lenda: nenhuma pessoa mais acredita na existência dessas criaturas, salvo sonhadores tidos como lunáticos saudosistas. São tomados por pura fantasia, porque há séculos não se tem notícia deles. Estamos numa sociedade medieval, com reis, princesas, castelos, cavaleiros. E ogros!

O choque que dá início à série (e à intriga) é a descoberta acidental, feita pelo jovem Cavin (Crispim no Brasil), da real existência dos ursos Gummi. Após um estranhamento mais que justificável (os Gummis fogem com horror de qualquer contato humano, acreditando que a descoberta de seu segredo possa levá-los à extinção), os ursos acabam confiando no jovem e este lhes entrega um velho amuleto presenteado a ele por seu avô (um dos lunáticos a que me referi acima!). O amuleto consegue abrir um livro místico deixado pelos antigos Gummis e nele os remanescentes da raça encontram magias poderosas que podem levá-los a combater seus inimigos e a ajudar as pessoas — que é, afinal, uma das funções primeiras e quintessenciais dos Gummis. Portanto, o encontro com Cavin e a consecução da abertura do livro possibilitam aos Gummis uma nova vida e missão: eles devem sair um pouco de sua obscuridade e ajudar a quem precisa, tentando a todo custo proteger sua independência e identidade.

Estamos no reino de Dunwyn, comandado pelo bondoso rei Gregor, pai da encantadora princesa Calla (Carla, em português). Tudo vai bem e em harmonia, exceto pelo enorme ressentimento de Duke Igthorn (inacreditavelmente chamado de Duque Duro por aqui!), ex-cavaleiro expulso das fileiras reais, que mora numa fortaleza decrépita chamada Drekmore e que deseja a todo custo tomar o reino e destronar o velho Gregor (uma curiosidade é que o mesmo ator originalmente dubla ambos os personagens, Michael Rye, e sua performance é invejável, sobretudo na voz do vilão). O duque afinal depara com os ursos e descobre que não só eles são reais como possuem uma arma poderosíssima: o gummiberry juice (um suco artesanal feito com as tais frutinhas, em quantidades, dosagens e procedimentos específicos), que aos ursos dá a capacidade de enormes e velozes pulos, mas aos humanos garante uma força sobre-humana (de duração bem limitada, contudo). A partir daí, o duque e seus aliados (ogros, burríssimos e enormes, exceto seu braço-direito Toadwart, minúsculo e bastante mais decente intelectualmente) não descansarão enquanto não puserem as mãos nos Gummis para descobrir a receita do tal suco.

A bem dizer, eles não querem nada com os ursos e para eles tanto faz como tanto fez haver ou não ursos coloridos saltadores na floresta. O que interessa a Igthorn é o suco, e nesse esforço ele e seus cupinchas tentarão por inúmeras vezes ludibriar os Gummis, seduzi-los, raptá-los, enganá-los, roubá-los, chantageá-los. De todas as maneiras possíveis. Igthorn sempre acaba frustrado e é um vilão cômico — a começar por sua figura desengonçada e seus trejeitos do Capitão Gancho de Frank Thomas, e seu rosto marcante mas estranhamente engraçado, que a mim me lembra muito o do grande Frank Zappa —, mas também é persistente e perigoso, o que me leva a destacar um dos grandes trunfos da série: a aventura!

Uma das razões para tudo funcionar bem é que realmente sente-se o perigo. Seja nas mãos de Igthorn ou em suas vidas cotidianas ou em perigos vários, sentimos quando os Gummis estão ameaçados, quando a situação está complicada, quando tudo parece perdido. Quando estão em perigo de morrer, ou de fracassar na defesa de suas metas, ou quando algum humano está em vias de descobrir o segredo de sua existência (sabem dele apenas Cavin, Calla e o próprio Igthorn — que tanto não quer saber tanto dos Gummis que nunca se preocupou em falar sobre eles para ninguém mais no reino!). Há sombras de problemas e obstáculos, o que torna tudo mais real e interessante; em séries como Darkwing Duck, por exemplo, perigos aparecem de maneira tão estilizada que não chegam a provocar comoção, parece tudo apenas caricatural e absurdo. Aqui (e em DuckTales) os entraves são para valer e tudo depende de acasos e competências, está tudo em risco e em jogo a todo momento.

Os Gummis a que somos introduzidos são seis: Tummi (Pancinha em tradução brasileira), gorducho e doce, compreensivo e amigo; Sunni (Soninha), a espevitada mocinha que se torna a melhor e inseperável amiga da princesa Calla; Gruffi (Bronquinha), o resmungão e faz-tudo, dono de insuspeitável grande coração e proclamador do gummi way dos antigos Gummis; Zummi (Maguinho), o ancião e sábio consultor dos livros antigos e ocasional feiticeiro; Grammi (Vozinha), a senhora cozinheira que possui a receita do suco tão desejada por Igthorn; Cubbi (Tiquinho), destemido e idealista, criança que encontra em Cavin um grande amigo e parceiro de aventuras. Ao longo da série, outros Gummis aparecem de passagem ou esporadicamente (como uma casta de Gummis guerreiros); e pelo menos um deles, Gusto (um artista empolgado e bon vivant), acaba se juntando aos seis protagonistas e partilha de suas histórias em muitos episódios.

Uma das chaves para o frescor da série é a rotatividade de personagens e suas personalidades. Não há um só protagonista e isso não permite que a matéria fique tediosa. Há episódios centrados neste ou naquele urso, ou naquele grupo, ou naquela combinação vilão e herói, ou um episódio apenas com "mocinhos" descobrindo verdades sobre si, ou tramas cotidianas ou etc. E há histórias de comédia, de drama, de suspense, de aventura propriamente dita; episódios curtos (10 minutos) ou "compridos" (20 minutos), uma variedade bastante expressiva que fez a série ter ao todo 95 (!) episódios e impressionantíssimas seis (!!) temporadas, recorde absoluto da animação televisiva Disney em todos os tempos. A série foi ao ar de 1985 a 1991. Boa parte dela foi lançada em DVD, o que já é um mérito: qualquer fã de animação Disney sabe como as séries televisivas são bastante menosprezadas, quase nenhuma disponível para venda ou mesmo localizável inteiramente na rede (para se ter uma ideia, boa parte dos episódios de Bonkers, série mais recente que The adventures of the Gummi bears, só se encontra na internet... dublada em russo!). A série foi tão popular que pulou para outras mídias, como brinquedos e gibis (boa parte das histórias em quadrinhos saiu aqui em meados dos anos 80/90, sobretudo pela extinta revista Disney Juniors, da Editora Abril).

A série dos Gummis teria surgido por inspiração dos famosos doces gelatinosos em forma de urso, mas dá para captar outras referências de animação e desenvolvimento narrativo no decorrer dos episódios. Pela ambientação, trajes e cenários, há muita semelhança com A espada era a lei, por exemplo; pelos personagens, com o famigerado O caldeirão mágico, sendo Cavin muito parecido com Taran e Calla, com a também princesa Eilonwy (e mesmo Toadwart é o mesmo Creeper, assistente do Rei de Chifres, mil vezes melhorado). Mas a meu ver os resultados obtidos pela série são muito mais felizes que os dos filmes citados, ainda que eu goste consideravelmente bastante deles (e sobretudo porque sendo dois longas de animação Disney os momentos antológicos de animação são inúmeros). Adventures of the Gummi bears não se deixa limitar pelo formato televisivo e pelas especificidades do subgênero infantil, apresentando-se antes como um produto de extremo refinamento e bastante profundidade, na relação entre as personagens, na direção e encenação e utilização dos elementos cênicos e de fantasia do cenário e das convenções narrativas e lendas medievais (aqui há monstros, magia, monarquia nobre, cavalaria heroica, até eventuais dragões!). Além de ser, assim como os doces que a teriam inspirado, uma grande delícia — com a indubitável vantagem de que, ao contrário das gelatinas, não enjoa e nem dá cárie!

domingo, 30 de março de 2014

Personagens de Jules Verne

Já coloquei aqui alguns textos que retirei de outras "plataformas" (sobretudo redes sociais), como os comentários sobre Notre-Dame de Paris e um pouco sobre a autobiografia de Brigitte Bardot. Das coisas mais antigas que escrevi "em público" (ou seja, na rede, ao contrário de redações e histórias da infância), resgato agora breves comentários que eu fiz, quando adolescente, no começo dos anos 2000, sobre os romances de Jules Verne (com muitos nomes adaptados para o português, afinal de contas eu era mais propriamente um leitor de Júlio Verne), livros que me fascinavam muito e encheram minha cabeça de terras diferentes e conhecimentos geográficos e humanos que ainda hoje me encantam e interessam. É sempre um prazer reler ou conhecer mais obras do grande e visionário escritor nascido em Nantes, e é com um pouco de tristeza por não o ter lido com frequência nos últimos anos que começo o resgate de sua memória com a recuperação destas breves notas sobre as criaturas de alguns de seus principais trabalhos. Naturalmente algumas impressões podem estar defasadas, mas creio que a paixão de um jovem leitor é uma das maiores provas de perenidade literária, afinal; havia a tendência de maior detalhamento dos últimos livros lidos, razão por que Família sem nome está bastante abrangida e na parte de Viagem ao centro da Terra não falo nada sobre a noiva de Axel ou a governanta da casa dos Lidenbrocks. Por fim, ilustrando o espaço, coloquei as capas de algumas versões que li dos livros citados.


A volta ao mundo em 80 dias

 

Phileas Fogg- Um dos personagens mais conhecidos de toda a galeria das aventuras vernianas. Phileas é um excêntrico inglês, capaz mesmo de apostar metade de sua fortuna em uma empresa impossível para a época, 1872: dar a volta ao mundo em apenas 80 dias! Muitos contratempos, atrasos previstos e um grande atraso imprevisto não prejudicam nosso herói. 

Princesa Aouda- Princesa hindu mas de aparência européia, foi educada na Europa e prometida a um esposo que vira apenas quando criança, muito mais velho que ela e que, ao falecer, faz Aouda ser obrigada pelas tradições de sua religião a morrer junto com ele. Mas Phileas Fogg e Passepartout a salvam de seu destino. Casa-se com o primeiro. 

Jean Passepartout- O mordomo francês de Phileas Fogg, é um verdadeiro quebra-galho: já foi de tudo, desde bombeiro até professor de ginástica (!). Apesar de suas trapalhadas, foi aceito como mordomo por Fogg, a quem muito se apegou quando descobriu sua genorisidade e bondade. Fica com o amo até o final, mesmo quando achou que tinham falido. 

Fix- É o detetive encarregado de prender o astuto larápio que roubou enorme soma do banco da Inglaterra. Por sua viagem nada convencional e sua personalidade excêntrica, Phileas Fogg acaba alvo de suas acusações, pois sabe-se que Fogg tem muito dinheiro e gastá-lo nessa viagem é estranho. Fix não é mau, é apenas um sujeito ambicioso e infeliz.


Viagem ao centro da Terra

 

Otto Lidenbrock- É geólogo e professor em uma universidade na Alemanha. Muito austero e rigoroso, quando descobre a maravilhosa viagem que o documento cifrado do alquimista Arne Saknussemm revela não pensa em outra coisa a não ser empreendê-la. É ambicioso e não teme nada que poderá atravancar sua conquista. Arrasta junto Axel e contrata Hans para guiá-los. 

Axel Lidenbrock- Sobrinho do Prof. Otto, é ele quem narra maravilhosamente romanceada a jornada ao centro do globo. Medroso, mas realista, Axel deixa-se levar pelos delírios de seu tio e o acompanha em sua fantástica aventura. Muitas vezes quis voltar atrás, mas conteve-se e resolveu seguir adiante. Já passou sede, se perdeu e padeceu muito na aventura. 

Hans- Personagem deveras misterioso, quase ou nada se sabe sobre sua origem, apenas que é um caçador de gansos. É o guia islandês contratado por Lidenbrock para guiar a missão. É muito gentil e competente, mas incompreensível aos leigos, pois só se comunica em islandês, sua única língua. Passa o livro inteiro em trabalhos duros que a sua constituição robusta facilita.


Família sem nome

 

Simão Morgaz- O grande responsável pelos conflitos do livro. Traidor de sua pátria, acabou revelando às autoridades inglesas a trama para conquistar a independência dos franco-canadenses no Canadá do início do século XIX, pois foi acuado pelo belicoso Rip. Seus filhos e sua mulher sofrem até as últimas conseqüências seu crime. 

João Sem Nome- Protagonista do livro, João Sem Nome é simplesmente João Morgaz, que absteve-se de seu sobrenome por razões óbvias. Tenta reparar o erro do pai a qualquer preço. É o maior herói dos patriotas. Mesmo com todos seus esforços e os de sua família, seu passado vem à tona e é martirizado. Tem um final trágico e não consegue triunfar no seu objetivo. 

Joann- O irmão de João. Torna-se padre e prega de paróquia em paróquia a ressureição franco-canadense. Patriota como todos na sua família (com exceção de seu pai, o traidor Simão Morgaz), não hesita em se atirar de cabeça à causa nacional, fato este que culminou em seu sacrifício voluntário em lugar do irmão, garantindo-lhe o posto de herói pela causa. 

Bridget Morgaz- Mãe dos protagonistas, essa sofrida mulher não conhecia a conspiração de seu marido. Morre julgada e desgraçada, ao descobrirem o sobrenome que tanto asco motivava. 

Clary de Vaudreuil- Filha do Sr. de Vaudreuil, essa heróica donzela não pensa duas vezes antes de se integrar aos assuntos de respeito à pátria. Apaixonanda por João, morre junto com este. 

Rip- Sujeito sem escrúpulos, age a serviço da coroa. Ele que induziu Simão Morgaz à traição. Odeia obstáculos à sua frente e acaba com quem o atrapalhar. 

Senhor de Vaudreuil- Não é conhecido seu nome. Francês de nascimento, assim como sua filha é um enérgico patriota e morre pela pátria. 

Nick- Nicolau Sagamoro teve de deixar seu honrado posto de tabelião para governar uma tribo indígena da qual descendia. É honesto e bondoso. 

Leonel- Assistente de Nick. É um poeta nato e partidário dos patriotas. Fica muito empolgado quando seu chefe é honrado com o convite de governar a tribo indígena. 

Tomás Harcher- Ele e sua mulher Catarina vivem muito felizes, conseguindo a proeza de ter gerado 26 filhos! Alguns deles morreram em combate, ou ficaram feridos. 

Patriotas- Núcleo muito volumoso de partidários à pátria, que abriga, dentre outros, William Clerc, André Farran e Vicente Hodge, que era apaixonado por Clary de Vaudreuil.


Cinco semanas em balão

 

Samuel Fergusson- Este sagaz homem, membro de uma sociedade geográfica de grande prestígio, se propôs a refazer a rota dos grandes viajantes que o antecederam e descobrir, de uma vez por todas, as nascentes do Grande Rio: o Nilo. Munido de provisões e equipamento, ele, seu criado José e seu amigo Kennedy são os heróis de tão interessante viagem. 

José- Criado do doutor Fergusson. Rapaz de boa índole, muito inteligente e apegado a seu amo. Na viagem em balão que realizaram, durante cinco semanas a fio, arriscou a vida várias vezes para salvar a de seus colegas. Bem humorado, José Wilson adora conversar e é sempre otimista com relação ao sucesso da empresa tão arriscada na qual está envolvido. 

Ricardo Kennedy- Também conhecido por Dick Kennedy, este escocês, robusto e exímio caçador, tentou de todas as maneiras possíveis fazer Samuel desistir de sua tão arriscada viagem ao tomar conhecimento do empreendimento nos jornais, mas no fundo também queria viajar com o doutor e José. Depois de um tempo, acaba ficando empolgado com a expedição.


Um padre em 1839

 

Jules Deguay- Protagonista do livro, Jules é um advogado iniciante, que se descobre apaixonado pela jovem Ana, a quem salvou a vida. Dedica uma inexplicável amizade ao velho sineiro Joseph, até a morte dele. 

Michel Randeau- O melhor amigo de Jules, está sempre pronto para os desabafos dele e para uma conversa amiga. Vai junto com o amigo investigar a autoria e as razões do crime, mas são impedidos pelos perversos padre e bandido. 
 
Ana Deltour- Garota frágil, teve a vida salva por Jules no terrível crime cometido numa igreja. A bela Ana se vê disputada por dois rivais completamente diferentes: o simpático jovem e o diabólico Pierre. 

Pierre Hervé- De família humilde, Pierre acaba passando para o lado do mal, talvez por seguir carreira forçada. Alia-se a mais dois parceiros malditos e quer possuir Ana. É o padre que dá nome ao livro.

Abraxa- Velha bruxa, faz feitiços e rituais satânicos. Ama Pierre como a um filho, e compartilha com este as maldades que faz e planeja. 

Mordhomme- Bandido, assassino, pilantra, calhorda, é difícil achar uma boa qualidade para este sujeito. Junto com Pierre destrói as provas do crime que cometeram. 

Mathurin Hervé- Pai de Pierre, Jean, Jeanne e da pequena Marguerite. Homem de pouca sorte, é casado com a insuportável Catherine. Sua casa desaba e ele por pouco não perde a perna. 

Jeanne Hervé- Irmã de Pierre, esta linda moça tem a índole muito boa e ama sua família, ao contrário de seu desgarrado irmão. Ajuda o pai na hora do acidente.

Joseph- O velho Joseph morre na ocasião do crime na igreja de São Nicolau, deixando um segredo para Jules, o que poderá mudar a sua vida. 

Sr. Dorbeuil- O benfeitor da família Hervé, os ajuda após o acidente e após ter sido salvo da morte por Pierre e Jean. É ele quem encaminha Jean a um emprego e Pierre ao seminário. 

Catherine Hervé- A acomodada matriarca da família Hervé é fria, distante, amarga, e em conseqüência disso acaba morrendo no desabamento de sua casa, por ocasiões funestas. 

Dr. Turpin- Médico apresentado a Mathurin pelo sr. Dorbeuil, para socorrê-lo com sua perna, literalmente esmagada. 

Marguerite- A pequena e indefesa filha de Mathurin morre no desabamento. 

Jean- O irmão de Pierre, encaminhado a um bom emprego pelo sr. Dorbeuil. 

Saraba- Velha bruxa, maléfica e de aparência miserável, morre no dia do crime. 

Gustave Desperrier- Amigo de Jules e de Michel, morre no atentado da igreja.


Robur, o Conquistador

 

Robur, o Conquistador- Engenheiro responsável pela elaboração e construção de uma maravilhosa máquina voadora, de nome Albatroz. Desconhece-se a sua nacionalidade e sua origem. Sabe que o futuro da aviação consiste em máquinas mais pesadas que o ar, e rapta tio Prudente e Filipe Evans para convencer os irracionais balonistas disso. 

Tio Prudente- Não é tio de ninguém, mas recebeu essa alcunha por viver nos Estados Unidos, onde parece ser muito comum o emprego do termo. Presidente do instituto Weldon, na Filadélfia. O referido instituto nada mais é que um clube de onde participam os principais nomes da aviação globista. 

Filipe Evans- Secretário do instituto Weldon e eterno rival de tio Prudente, também é um globista inveterado, e mesmo diante das maravilhas do Albatroz mantém firme sua postura. Mais contido que seu colega, mas também cruel a ponto de planejar, junto a ele, uma terrível vingança por conta do rapto praticado por Robur, que se vingará. 

Fraicolin- Criado de tio Prudente, é um homem negro não muito eficiente e extremamente medroso. Foi também vítima do seqüestro de Robur. 

Tomás Turner- Contramestre do Albatroz, muito hábil. 

Tapage- Gascão, é o cozinheiro do Albatroz

Instituto Weldon- Tem entre seus membros Jem Cip, o vegetariano, e Guilherme T. Forbes.


O Senhor do Mundo

 

Robur- O mesmo engenheiro da obra anterior, que leva o seu nome, agora em poder de uma máquina muito mais poderosa que o Albatroz: o Assombro, que possui as múltiplas características de carro, avião, submarino e navio (!). Esse engenho prodigioso feito por ele o faz se nomear O Senhor do Mundo. Enlouquecido, Robur não pensa nas conseqüências de seus atos, a bordo do Assombro

João Strock- Narrador do livro, Strock é inspetor-chefe da polícia de Washington, e recebe ordens de Ward para investigar o mistério do Grande Ninho. Curioso e intrépido, Strock ver-se-á envolvido nos planos do talvez megalomaníaco, talvez heróico Robur, sendo assim levado a bordo da espantosa máquina Assombro

Ward- Não se sabe ao certo seu nome. Diretor-geral da polícia de Washington, Ward também anseia por saber a chave de todos os mistérios, o que o faz colocar Strock à frente das investigações. Ward faz vários contatos para Strock obter sucesso, mas não as coisas não correm do jeito esperado.


Os quinhentos milhões da Begum

 

Marcelo Bruckmann- Jovem alsaciano esforçado e muito competente. Consegue colocar em ação um plano audacioso para penetrar nos segredos da Cidade do Aço criada pelo maquiavélico Schultze. Verdadeiro herói e um filho que Dr. Sarrasin nunca teve, mas sempre sonhou em ter. 

Dr. Sarrasin- Cientista homenageado pelo Congresso Internacional de Higiene, por uma bela invenção que criara. Bom e altruísta, desejava apenas empregar sua parte na herança da Begum em fins humanitários. 

Schultze- Raivoso professor alemão que acredita na teoria da pureza da raça ariana. Vilão como poucos na bibliografia verniana, contrói a poderosa Cidade do Aço e se torna o magnata desse metal. Pretendia destruir por completo a Cidade da França e todos os seus habitantes, mas fracassa. 

Otávio Sarrasin- Filho do Dr. Sarrasin. Desaponta bastante o pai no sentido de que prefere diversão à obrigação. Caráter difícil, mas seu amigo Marcelo consegue endireitá-lo, para felicidade geral dos seus familiares. 

Família do Dr. Sarrasin- Os habitantes da casa do bom doutor, que, fora ele e seu filho, consistem em sua boa e paciente esposa e sua bela filha Joana, que, após crescer mais um pouco, casa-se com seu grande amor, o jovem alsaciano. 


A aldeia aérea

 

Max Huber- Ele quer mais que o inesperado: o extraordinário. Para esse francês, toda aventura é pouca. Ele quer emoções fortes. Mas quando se encontra preso na aldeia aérea almeja voltar à "civilização", o que acaba por acontecer. É exímio caçador. 

João Cort- Melhor amigo de Max, um americano valente e que, junto ao francês, adotou uma criança africana. Durante sua permanência na aldeia, aproveita seu tempo para estudos diversos acerca de sua população e seus respectivos costumes. 

Khamis- Guia africano de origem árabe, é sábio e precavido, permanecendo fiel aos seus amigos a trama inteira. Planeja de todo modo fugir da aldeia, povoada por seres estranhos que ele considera inferiores. Conhece muito bem várias regiões da África. 

Urdax- Desafortunado membro da expedição ao Congo, esse traficante português de marfim é sujeito pacífico e de índole amistosa. Fica amigo de todos, mas, durante um ataque de elefantes, acaba tendo fim trágico, por querer até o último instante, transtornado, defender seu lucro. 

Langa- Criança adotada pelos amigos Max e João, foi comprada de uma tribo africana e escapou, assim, de terrível destino. Gosta muito dos dois aventureiros e, sem instrução, é esperto e muito vivo. Faz amizade com Li-mai, o que garante a todos proteção na aldeia. 

Doutor Johausen- Explorador que, seguindo os passos de seu antecessor Garner, pretende estudar a linguagem dos macacos. Fracassa, porém, e termina seus dias gordo e demente, aclamado soberano (Msélo-Tala-Tala) da aldéia aérea, num triste fim para quem era tido como desaparecido. 

Li-mai- Pertencente à estranha raça dos wagddis, seres entre o homem e o macaco, vive em Ngala, a aldeia aérea, com seus pais. Salvo por Langa, essa pequena criança de fenótipo consideravelmente simiesco afeiçoa-se muito a ele e sua família protege a todos quando são feitos prisioneiros na aldeia.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Backgrounds da Disney

Os longas animados da Disney são conhecidos sobretudo por sua famosa "character animation", ou animação de personagem, arte levada ao refinamento por gente como os Nine Old Men (gente como Milt Kahl, Frank Thomas, Ollie Johnston e Ward Kimball) e também por artistas mais recentes como Glen Keane, Eric Goldberg e Andreas Deja, que consolidaram a animação disneyana e a consagraram e tornaram referência há várias décadas.

Mas nem só de personagens vive um filme de animação. Existe muita coisa ali, meticulosos e perpétuos trabalhos técnicos, da colorização à arte-final, dos "inbetweens" (os desenhos repetidos à exaustão, entre as cenas-chaves designadas pelo animador supervisor) aos efeitos "especiais" e ao processo de se selecionar o "tom" do filme, há muito o que se decidir, pensar no que utilizar, quais instrumentos usar, qual o tipo de visual para o conceito que se quer imprimir ao trabalho. Uma das principais etapas para dar a "cara" adequada ao filme são os backgrounds.

Trata-se simplesmente dos fundos de cena. Mas é ali que as personagens se movimentarão, é ali que se dará a encenação e o desenvolvimento do filme como uma narrativa amparada em uma estruturação de imagem e percepção. Sem os backgrounds, as personagens flutuariam num nada, sem a força plástica da ambientação, sem os recursos narrativos que isso comporta.

Provavelmente o filme mais ambicioso da Disney nesse aspecto foi A bela adormecida, lançado em 1959. Os fundos de Frank Armitage e (principalmente) Eyvind Earle foram cruciais para a amplidão um pouco "megalômana" (mas satisfeita) do projeto ao qual Walt Disney vislumbrou com um requinte e detalhamento inauditos, para exibição numa larguíssima tela widescreen nos cinemas — extensão enorme e de poderosa profundidade e poder de sugestiva imersão.

A seguir, alguns backgrounds (clicando nas imagens, elas aumentam) impressionantes de quatro clássicos do estúdio, bem diferentes entre si. Os títulos dos filmes são um link para os sites de onde retirei as imagens, e a visita a eles é recomendadíssima.

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Pinóquio (1940) - Claude Coats
Detalhada reconstrução de oficinas de brinquedo, ambientes de espetáculo, locais cheios de peças e objetos.



Bambi (1942) - W. Richard Anthony
Ambientes abertos, escuros e calmos, com folhas, árvores e cores calmas, frias, exuberantes ou melancólicas.


A bela adormecida (1959) - Eyvind Earle
Requinte e detalhamento obsessivo, ornamentos de luxo, ambientes naturais cheios de tons e matizes e formas.



101 dálmatas (1961) - Walt Peregoy
Despojamento, cores fortes e "cartunescas", que vazam dos objetos/figuras, tons climáticos ou soturnos, modernidade.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Asterix, o gaulês

Asterix, um dos personagens mais célebres e populares dos quadrinhos mundiais, nasceu em 1959, nas páginas da icônica revista Pilote, pelas mãos do desenhista Albert Uderzo e o prolífico roteirista René Goscinny (que também escreveu os melhores momentos de Iznogoud e Lucky Luke). Nasceu sob muitas ideias, sobretudo duas: retomar satiricamente a identidade francesa, abrangendo histórias passadas na antiga Gália Celta, e derrubar alguns estereótipos clássicos dos quadrinhos históricos e de aventura, dando a luz do protagonismo a uma figura baixinha, feiosa, bigoduda e bastante ridícula em aparência.

Se nasce como uma espécie de paródia, Asterix aos poucos consegue libertar-se das limitações de concepção e cresce; não em tamanho, pois o diminuto guerreiro gaulês sempre foi e será baixíssimo de altura. Mas cresce em qualidade, em experimentalismo, em ousadia, em brilhantismo. Aos poucos os textos geniais de Goscinny e os desenhos fluidos e engraçados de Uderzo conquistam seu espaço e vão arregimentando legiões (ironia) de fãs e admiradores, que fizeram dessa série de pouco mais de trinta álbuns (uma quantidade até pequena, se considerarmos as décadas de vida do quadrinho) um sucesso estrondoso e dificilmente igualado, que originou uma profusão incrível de jogos, filmes, animações e até mesmo um parque (!), localizado em Paris (a Lutécia da Roma antiga).

Estamos em 50 antes de Cristo. Toda a Gália foi ocupada pelos romanos. Toda? Não! Todos sabemos da aldeia dos irredutíveis gauleses, que desafiam César e seu poderio e resistem hoje e sempre ao invasor. Magnífica experiência imaginativa, Asterix é um giro pelo mundo conhecido na Antiguidade: Roma e suas fronteiras, a Helvécia (Suíça), a Hispânia (Espanha/Portugal), a Bretanha (Inglaterra), a Normandia (Noruega), não há terra por onde os gauleses não tenham estado, e nem personalidade histórica com que não tenham deparado — além de César, comum encontrarmos Brutus, Pompeu, Cesário (Ptolomeu XVI), Cleópatra... E ainda o reforço de coadjuvantes bem pensados e dosados: comerciantes fenícios, artesãos gregos e egípcios, piratas e afins. Todo um mundo em Asterix.

Mas não é só por esses aspectos que Asterix é grande. É difícil falar de uma série como essa, pois cada elemento parece ter sido cuidadosamente desenvolvido para um efeito, geralmente com ótimos resultados. O humor, por exemplo, que torna hilária cada trama, que desenvolve cada caráter das personagens (variadas, delirantes, críveis), que transforma o cotidiano corriqueiro da pequena aldeia da Armórica em uma festa de graça, de espírito e de engenhosidade. Goscinny faz cada personagem e situação serem embutidos com a mais intensa percepção da sátira convincente e humana; Uderzo pincela habilmente as expressões, movimentos corporais e gestuais para que não tenhamos aquelas gentes e coisas como eventos de papel, mas como realizações cheias de dimensão e profundidade. Um casamento perfeito.

Casamento desfeito com a prematura morte de Goscinny em 1977, aos 51 anos de idade. De 1959 a 1977 os álbuns de Asterix floresceram como quintessência do mais alto grau do humor nos quadrinhos europeus (e de todo o planeta). Seus vinte e três álbuns e meio (faleceu no meio da produção de Asterix entre os belgas, o 24º livro da coleção) são um testemunho de vigoroso talento e extremada competência. Tudo que ele fez no período é digno da mais alta reverência. Meus particulares destaques vão para perfeições como A cizânia, Asterix entre os normandos, Obelix e companhia e O domínio dos deuses.

Com a morte de Goscinny, houve o medo da interrupção definitiva de Asterix. Numa decisão algo estranha, Uderzo resolve ir além dos desenhos e também roteirizar as aventuras de Asterix, seu grande (até literalmente) amigo Obelix e demais gauleses. O primeiro álbum nessas condições, após a finalização do inacabado por seu parceiro René, foi O grande fosso, seguido de seu melhor momento "solo": A odisseia de Asterix. Infelizmente, Uderzo revelou-se terrível roteirista, e, pior, continuísta sofrível: as histórias escritas por ele por vezes eram desconexas das talhadas por Goscinny, com erros de dados (como o aniversário de Asterix e Obelix, contrastante em Obelix e companhia, de 1976, e Asterix e Latraviata, vindo à luz em 2001), problemas de caracterização das personagens (o "poder especial" do bardo Chatotorix em As mil e uma horas de Asterix), ou até mesmo heresias contra o próprio espírito da série e as estruturas da saga toda, como no terrível A galera de Obelix, em que o personagem-título faz algo que não deveria nunca fazer, por proibição do druida Panoramix. O último álbum de Uderzo foi O dia em que o céu caiu, que fecharia de vez a coleção (a capa era uma espécie de reverso da capa do primeiro álbum, inclusive).

Inesperadamente, há relativamente pouco tempo, Uderzo mudou de ideia e resolveu passar a série adiante. Em 2013 houve a estreia mundial de Asterix entre os pictos, primeiro álbum de Asterix sem participação de Uderzo (que fez apenas o desenho de Obelix na capa). Jean-Yves Ferri assumiu os roteiros, desenhados doravante por Didier Conrad. O novo livro, feito um tanto apressadamente, não foi dos mais satisfatórios (apesar de não ser ruim como os piores da fase solo de Uderzo), mas ainda é cedo para falar do futuro da série. O que se pode falar é que Asterix continua fazendo um colossal sucesso (o novo álbum vendeu como água), e muita água virá para frente. Água ou poção mágica, com muita disposição para caçar javalis, destruir acampamentos romanos ou simplesmente divertir, entreter e encantar os leitores que há cinquenta e cinco anos acompanham entusiasmados os banquetes, viagens e inúmeras brigas dos habitantes da aldeia chefiada pelo "colérico" Abracurcix. Ave!

Nota 1: Clicando sobre as figuras, é possível vê-las em tamanho maior; atentar para a diversidade de personagens e o detalhamento de Uderzo.
Nota 2: Optei por escrever os nomes em português, com as traduções e sem acentos. Quem souber francês terá em Asterix farto material de riso, com tiradas como o bardo chamando-se Assurancetourix, transposição marota de uma publicidade de seguro de vida que "cobre todos os riscos".
Nota 3: Os nomes terminados em "ix", são claro, homenagem ao líder gaulês Vercingetórix, que depôs as armas aos pés de César (feito mostrado literalmente em O escudo arverno); romanos têm nomes terminados em "us", egípcios em "is" etc.
Nota 4: Há MUITO o que se dizer sobre Asterix, e claro que este texto é pálido rascunho do que já foi mais do que dissecado em comentários, estudos, críticas, teses, reportagens e inúmeras outras formas de análise. Como uma demonstração da amplidão da influência e do alcance e popularidade alcançados pela série, estão expostos a seguir a ótima abertura do primeiro filme live action, estrelado por Christian Clavier (Asterix) e Gérard Depardieu (Obelix), a íntegra do melhor longa de animação com os personagens de Goscinny e Uderzo (e o único com roteiro original), um dos vários documentários com entrevistas sobre os autores do quadrinho, um exemplo de game inspirado em Asterix e uma pequena conversa dos novos autores da série, Ferri e Conrad.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Columbo

Tramas policiais muitas vezes sofrem com a desonestidade dos whodunits; ora, se todos, a todo instante, podem ser criminosos, o desenvolvimento das personagens é uma aleatoriedade e preza-se simplesmente a surpresa, a revelação. É algo um tanto desonesto, basta pensar nas novelas televisivas que, quando reprisadas, mudam o culpado original. É qualquer coisa, sem critério.

Columbo é diferente dessa rotina de convenção. A cada episódio (ou telefilme), o espectador acompanha, no início, o iter do criminoso, o que ele faz até chegar ao assassinato. Acompanhamos a execução passo a passo (ao longo das décadas de exibição, houve apenas duas exceções a essa filosofia narrativa). Ainda que não entendamos a princípio todos os motivos ou "truques" efetuados para despistar suspeitas, sabemos quem armou o plano e fez as ações.

E aí entra o Tenente Columbo, feito por um fabuloso Peter Falk em 69 telefilmes, de 1968 a 2003 (trinta e cinco anos, treze "temporadas"). Columbo é um personagem ímpar. Dono de uma capacidade dedutiva extraordinária, o humilde oficial do Departamento de Polícia de Los Angeles só encontra rival em Sherlock Holmes. Consegue enxergar minúcias, apontar paradoxos, concluir uma investigação com base
naquilo que é óbvio mas não aparente, que todos haviam desprezado.

Columbo não pega em armas — em uma ocasião, inclusive, tentou fazer com que se passassem por ele num obrigatório exame de tiros da polícia —, não participa de corridas e perseguições, não se interessa por nenhum aspecto movimentado da vida policial. Seu método consiste em andar pelos ambientes relacionados aos assassinatos, ligar um fato a outro, pensar e inquirir os suspeitos — insistentemente, sempre "lembrando" de algo no último instante e os irritando, acabando com a diplomacia inicial e despertando a agressividade dos que até então possuíam álibis perfeitos.

O policial que vemos aqui é um retrato marcante e incomum: educado, cordato, boa praça, também sempre lembrado por seus trajes amarrotados (o icônico sobretudo bege), o indefectível charuto numa das mãos, o caderninho de notas, o carro decrépito, a aparência desleixada. Inúmeras vezes é tratado mal por seu jeito simples e expansivo, por seus modos "não refinados". Já foi perguntando se estava disfarçado, questionado se de fato era da polícia e até mesmo confundido com mendigo! É que Columbo também é visto nesses momentos "não heroicos", das fragilidades do cotidiano: vai ao veterinário levar seu cachorro, visita o dentista quando um dente lhe dói, chega na cena do crime com a barba por fazer, cara de sono e comendo algum lanche apressado apenas para matar a fome... Columbo é gente como a gente, com todas as dimensões e facetas da pessoa comum. Não é sobre-humano, é um gênio que diverte por seu jeito estabanado, sua tranquilidade e impertinência (quando ele descobre/intui sobre quem é de fato o homicida, "gruda" inescapavelmente nele). Leva o trabalho a sério mas não faz disso uma tarefa estressante, anda disposto e de bom humor, com leveza, fala da família e da mulher — sempre referenciada, jamais mostrada; a não ser numa absurda série spin-off que inventaram certa feita, sem Falk e apenas com a Mrs. Columbo, que deixa de ser a esposa do dedicado policial e vira ela também uma combatente do crime.

Ao longo da série, inúmeras celebridades cometeram seus assassinatos: José Ferrer, Martin Landau, Vera Miles, Donald Pleasence, Robert Culp, Louis Jourdan, Patrick McGoohan, Johnny Cash, Ray Milland, Leonard Nimoy, William Shatner, Oskar Werner... Os episódios foram dirigidos por gente como Steven Spielberg (em seu passado televisivo setentista), Patrick McGoohan (que já matou em vários telefilmes da série, sendo quem mais nela apareceu depois de Peter Falk!), Ben Gazzara, James Frawley (diretor do primeiro e genial filme dos Muppets), Richard Quine e, não creditamente, John Cassavetes (também um assassino de respeito, em Étude in black, um dos melhores momentos da série inteira). Mas é sempre Columbo e Peter Falk quem encantam e dão o sentido à série, a despeito de todas as virtudes estilístico-narrativas de cada telefilme.

A série fez sucesso e ganhou vários prêmios e reprises, algumas tentativas de refilmagem, livros. Seus criadores, William Link e Richard Levinson, são também os autores por trás da célebre Murder, she wrote, estrelando Angela Lansbury. Mas nem eles e nem Peter Falk, apesar de bem sucedidos em outros trabalhos (sobretudo Falk, que fez muitos papéis importantes), conseguiram (ou mesmo quiseram) se livrar da fama do assombrosamente inteligente Tenente Columbo. Ainda hoje a série possui um séquito de fiéis adoradores e é objeto de análises, revisões e sátiras e paródias, sinal de sua grande aceitação na cultura popular, e não só.

Resolvi escrever este texto como uma pequena homenagem a esse colosso televisivo, na empolgação de rever uma de suas temporadas (a terceira), mas, relendo-o, acho-o incompleto e pobre, sem dar a dimensão do brilhantismo de tudo. Assim como Columbo, a qualquer momento lembro de "uma coisa curiosa que não me sai da cabeça" e acrescento just one more thing...

Finalmente, alguns momentos/vídeos interessantes da série (o último trecho é um dos meus favoritos de todos os filmes):