BONANZA é um dos nomes do faroeste televisivo mais icônicos e lembrados, após décadas de sua exibição original. Foi uma série extremamente longeva, quase quinze anos no ar, com cerca de quatrocentos e trinta (!) episódios. Sua popularidade era incontestável, e mesmo hoje podemos ver como a série ainda tem apelo: além dos inúmeros DVD espalhados em lojas e bancas de jornal, a série é reprisada, de segunda a sexta-feira, no canal brasileiro do TCM. E sua exibição principal se dá no início do horário nobre! Trocando em miúdos, 1/12 da programação diária do TCM é dedicada a
Bonanza! Não é um feito pequeno para uma série de mais de cinquenta anos (começou em 1959, durou até 1973).

A verdade é que
Bonanza não é esquecível. Fica na memória e faz parte da vida de cada espectador que acompanha ou acompanhou o programa. Como esquecer sua abertura, sua música-tema? Os desenhos dos créditos, que lembram tanto os
dime novel, os frontispícios de gibis clássicos? As razões do sucesso da primeira série de faroeste filmada integralmente a cores são simples: suas histórias e seus intérpretes.
Bonanza trata de um núcleo de personagens não tão comuns em faroestes: uma família. Trata-se do veterano ex-militar, ex-comerciante e atual latifundiário Ben Cartwright (Lorne Greene) e seus três filhos Joseph, ou "Little Joe" (Michael Landon), Eric, ou "Hoss" (Dan Blocker), e Adam (Pernell Roberts). A variedade impressiona: cada um é filho de uma mulher diferente, as três falecidas esposas de Ben. E cada um possui distinta personalidade: Hoss é o gentil grandalhão, de coração afável e modos amigáveis; Adam é o que estudou no Leste e por isso é um pouco mais arrogante e sério; Little Joe é o impulso da juventude, o inconsequente e briguento. Mas todos se parecem com Ben quando devem ajudar alguém, trabalhar juntos, resolver algum problema.

No rancho Ponderosa, os quatro vivem aventuras de tons diversos: às vezes estão envolvidos em algum problema grave e com risco de morte ou outro infortúnio, às vezes cortejam alguma mulher e tentam estabilizar um relacionamento, às vezes divertem-se em planos, esquemas e confusões cômicas. O seriado não se concentra em nenhum personagem (ainda que evidentemente Ben una tudo e todos), e em nenhuma saga específica. São tramas fechadas e os Cartwrights vão seguindo dia após dia sua vida cotidiana.
Apesar de não haver coadjuvantes fixos, por a ação ser voltada aos Cartwrights e a Ponderosa, algumas figuras apareciam com frequência: Candy, o faz-tudo da fazenda (praticamente o "quarto irmão" da família); o xerife Roy Coffe, envelhecido mas sagaz defensor da lei; Clem, o outro braço da lei; Hop Sing, o chinês imigrante que é o cozinheiro de Ben etc. Esse reforço era necessário uma vez que, por as temporadas do programa serem longas, nem sempre todos os atores protagonistas estavam disponíveis para todas os episódios. Há, portanto, uma mistura não só de episódios cômicos, de aventura, de drama, de romance, de ação, mas também de episódios em que Hoss se destacava, ou Ben, ou Adam, ou Little Joe, apesar de os esforços serem focados para apresentar sempre todos eles unidos e interagindo.

Adam, por sinal, saiu da série após a sexta temporada. Insatisfeito com os roteiros, alegadamente, Pernell Roberts deixou os Cartwrights com a triste missão de cavalgar apenas em três, e seu Adam foi, como dito em alguns episódios, viajar, comunicando-se com sua família por cartas. A série aguentou bem: mais da metade dos episódios ainda seria produzida. Candy foi um dos esforços de substituição para Adam, e mais ao fim da série um jovenzinho foi adotado por Ben. E além desses coadjuvantes onipresentes, havia larga profusão de atores convidados, os "guest stars". Nos primeiros anos da série era comum ver gente que estava começando no
showbusiness e que ainda ficaria muito famosa: Jack Lord, James Coburn, Lee Marvin, Gena Rowlads, Charles Bronson... Além desses, muitos outros coadjuvantes e figurantes apareciam por episódio, tornando o microcosmo de Virgina City (a cidade contígua a Ponderosa) um ambiente bastante crível e aprofundado — tentando a todo custo romper a "inverossimilhança" dessas séries, onde num episódio aparecia um ator (que apenas apareceria naquele episódio) que tal ou tal personagem recebia como um grande amigo, por exemplo; ora, se era um grande amigo por que nunca apareceu antes e nunca apareceria depois?

A série foi se mantendo durante mais de uma década, quase sempre com audiência respeitável e público fiel. Mas o natural desgaste de uma produção tão extensa (em anos), a decadência do faroeste americano (com a chegada do
spaghetti) e também a prematura morte de Dan Blocker (Hoss chegou a morrer também na série, num recurso incomum para a época) precipitaram seu fim. Michael Landon engatou logo
Os pioneiros — onde agora era ele o patriarca de uma família —, Lorne Greene foi para o espaço em
Battlestar Gallactica, Pernell Roberts foi ser médico no spin-off de
MASH intitulado
Trapper John, M.D., a vida seguia adiante sem
Bonanza. Aliás, falando no
MASH de Robert Altman, uma curiosidade: esse grande cineasta dirigiu muitos episódios desta nossa série de faroeste, e ficou tão amigo de Dan Blocker que, quando de sua morte, correu logo para dedicar ao amigo um de seus mais aclamados clássicos:
The long goodbye, mais uma aventura de Philip Marlowe (desta vez encarnado por Eliott Gould). Passaram por
Bonanza também: William Witney, Jacques Torneur, Tay Garnett. Michael Landon se importava tanto com a série que dirigiu e escreveu em vários momentos, também.
Para atestar a qualidade de
Bonanza basta não se deixar levar pelo preconceito e achar que é uma série embolorada e desinteressante hoje. Em suas histórias vemos muitos elementos progressistas que a tornam muito atual e pertinente: direitos indígenas, denúncia da intransigência do exército, igualdade racial, luta pelo feminismo. Há em quase todas as personagens e tramas um grande desejo por compreensão entre os povos, por paz entre as nações, amizade entre as pessoas. São alguns dos motivos que tornam o seriado um ícone, que ainda hoje emociona e encanta. Conhecer os Cartwrights não é apenas deparar com a história da colonização norte-americana, seus problemas e problemática, e também não é apenas adentrar a história da televisão e seus seriados historicamente bem sucedidos: é fazer amigos, estar com eles na luxuosa e confortável casa de Ponderosa, tentar junto a eles corrigir injustiças e participar, como um Cartwright, daquela vida, respirar aquela poeira nas cavalgadas e sentir o sol nas costas durante as tardes tranquilas (ou não) de Virgina City.
A seguir, duas aberturas de Bonanza, com arranjos e elenco fixo modificados (respectivamente, primeira e décima temporada):